Vinte e quatro famílias residentes entre as ruas Oti e Tamoios no bairro Casa Verde, região da Capela em Vinhedo, foram notificadas pela Prefeitura a deixarem suas casas por ser uma área de risco. O trecho em questão foi classificado pelo Instituto Geológico (IG) como grau 4, o maior de todos na escala de deslizamentos.
Os moradores foram pegos de surpresa com a decisão e alegam nunca terem sido alertados sobre os riscos do local, embora residam há bastante tempo no bairro. Eles foram notificados na quarta-feira, 9, de que teriam até o domingo, 13, para deixarem suas casas. O jornal de Vinhedo conversou com exclusividade com moradores do local e trouxe o relato dos munícipes na edição impressa do sábado, 19.
“Moramos aqui há 40 anos e só agora que viram isso? Como vou sair da minha casa às pressas e colocar nove pessoas neste cubículo que a Prefeitura quer nos dar?”, questiona a diarista Sandra Regina Vieira que, assim como a maioria das famílias, se recusou a deixar o local.
Embora os moradores só tenham sido avisados na semana passada, a discussão vem desde 2012, por meio de uma ação civil pública movida pelo Ministério Público. Decisão do juiz da 2ª Vara da Comarca de Vinhedo proferida no último dia 5 determinou que a Prefeitura promovesse o reassentamento das famílias no período de 30 dias.
A Prefeitura, por sua vez, recorreu da decisão alegando que não teria responsabilidade pelo reassentamento das famílias e que um novo laudo pericial seria necessário para identificar o risco que existe no local, mas o Tribunal de Justiça negou o agravo de instrumento e determinou que o município notificasse as famílias sobre a decisão e promovesse o reassentamento das mesmas até semana passada.
Para informar os moradores sobre a decisão judicial o prefeito Jaime Cruz (PSDB) promoveu uma reunião no último dia 9, oferecendo uma área para as famílias ficarem temporariamente até que o novo estudo seja realizado. Diferentemente da versão que a Prefeitura enviou à imprensa no último sábado, 12, a municipalidade não se antecipou à decisão e ofereceu um local para os moradores, mas foi obrigada pela Justiça a proceder desta forma.
“Sem que haja análise antecipada do mérito, a responsabilidade do agravante em questão, decorre, em princípio, de sua competência para disciplinar e controlar a ocupação do solo. Diante dos fatos alegados, dos estudos que embasam a ação e da própria audiência que resultou na decisão recorrida, há, deveras, risco envolvido na área em questão. Por fim, há dispositivo legal expresso que impõe ao Município, em área de risco, a realocação dos ocupantes do núcleo urbano informal a ser regularizado”, escreveu o relator Vicente de Abreu Amadei na decisão.
Moradores expõem dificuldades
O local oferecido pela Prefeitura, segundo os moradores é uma casa estilo quitinete no bairro Altos do Morumbi, próximo aos novos prédios do CDHU, que foi adaptada para receber os moradores. Ela possui um cômodo e um banheiro para cada família, totalizando 30 m² por casa. Segundo os moradores, a casa ainda não possui vidros e nem energia elétrica é cercada por mato alto.
O problema principal, no entanto, é que na maioria das residências há mais de uma família no local. “A gente não invadiu um espaço ou comprou um terreno irregular. Nossas casas estão regularizadas. Agora como que eu, que tenho 12 membros na família, vou conseguir morar em 30 m² da noite para o dia?”, questiona Silvana Maciel, que mora no bairro há 36 anos.
Outro morador que se recusou a sair foi Maycon Gemme, que reside há 28 anos no bairro. “Nunca ouvíamos falar nada que corríamos risco de vida aqui. Meu avô tem quase 90 anos, não dá para mudarmos assim do nada. O próprio prefeito pediu que a gente arrumasse um advogado para ajudar”.
Já a vizinha, Beatriz Ventura Gomes, está à procura de uma nova casa. Como paga aluguel, foi orientada pela proprietária a se mudar. “Eu tenho uma filha de 9 meses, não tem como eu ficar aqui e colocar a segurança dela em risco”, destaca.
“Vieram com polícia e tudo aqui no bairro, parecia que éramos criminosos. Eles disseram que estavam aqui para proteger nossa integridade física. Mas por que não falaram isso antes para a gente? Isso não deve ter sido decidido agora. Achei um absurdo ser tratado desse jeito.”, reclama Claudionor Pinto da Silva, que há 32 anos mora no local.
“Eles deram quatro dias para a gente sair. É um absurdo, a casa não tem nem água ainda que querem levar a gente. Faz uma semana que não dormimos. A pressão subiu, estamos vivendo dias difíceis”, completa Maria de Lourdes Ormeneze, que habita o bairro há 29 anos.
Para deixarem as residências, os moradores reivindicam a concessão de um auxílio aluguel, como foi feito com os moradores que residiam às margens da linha do trem e um detalhamento maior por parte da Prefeitura, já que o próprio órgão disse aos moradores que não tem verba no momento para contratar o estudo e, eventualmente, fazer as obras necessárias. “Estamos no fim do ano, nunca que a situação vai ser resolvida em três meses. Nem a empresa do estudo foi contratada ainda, o que dirá as obras. Queremos esse planejamento da Prefeitura, que nos mostrem os laudos falando que estamos em perigo”, cobra a aposentada Teresa Cristina Oliveira, que mora há 27 anos no local. “Isso é desumano o que estão fazendo com a gente, eu não tenho carro, sou aposentada, como vou morar lá nesse local que nem transporte tem. Preciso de um local para deixar minhas coisas, é tudo o que tenho”, solicita.
“Estamos acompanhando de perto a situação”
Na reunião realizada na última semana, o prefeito Jaime Cruz disse que dará todo o respaldo aos moradores. “O Instituto Geológico aponta aquele local como de risco 4, o maior na escala, com suposto risco de deslizamento. Houve uma primeira decisão judicial. Nós recorremos, mas o Tribunal de Justiça concordou com o juiz de primeira instância, nos obrigando a notificar os moradores para que deixem aquele local até o próximo domingo, dia 13. Decisão da Justiça deve ser cumprida. Mas daremos todo respaldo possível aos moradores. Estamos juntos com vocês”.
Segundo a assessoria de imprensa, a Prefeitura está realizando os procedimentos necessários para contratação em caráter emergencial de um estudo geológico para constatar a situação atual da área. Se o laudo constatar que o risco é menor que o apontado pelo IG, será apresentado à Justiça para que ocorra autorização judicial para liberação dos imóveis. “O laudo poderá apontar, também, se há a necessidade de obras e quais seriam essas intervenções para que a Administração Municipal tome as providências necessárias”, explicou.
O Jornal de Vinhedo encaminhou uma série de perguntas à Prefeitura, questionando os motivos dos moradores não terem sido avisados antes sobre a situação, de que maneira as famílias serão acomodadas no espaço, se é possível oferecer um auxílio aluguel, mas obteve como resposta somente que “a Prefeitura está respeitando a legislação vigente e a determinação judicial”. O órgão também informou que até a quinta-feira, 17, somente uma família oficializou junto à Prefeitura que deixará o local.